Num tempo em que se toma consciência de que o mar não é infinito nas suas possibilidades regeneráveis e, neste caso concreto que pretendemos abordar, por analogia, situa-se a vertente da árvore que se derrete quotidianamente como pasto seco em incêndios.
Assim, sem surpresa damos conta de que certas espécies autóctones mediterrânicas são remetidas ao trivial, como se elas não tivessem um papel preponderante ao nível socioeconómico de uma região (Algarve), e sejam atiradas para os esconsos de uma soturna prateleira de qualquer instalação desgastada pelo inapelável tempo da história. E no entretanto, algumas dessas árvores resistem individualmente vários séculos na sua existência resiliente, perfeitamente integradas no seu seio. De uma delas estamos a falar da vulgar alfarrobeira (ceratona siliquoa da espécie ”cesalpiniácea” (vide Wikipédia).
Por exemplo, decoram-se espaços públicos urbanos com árvores de primeira linha, que foram consideradas ornamentais para ruas, avenidas e jardins frondosos, enquanto outras espécies mais rurais (coitadas), e menos reputadas, são apenas classificadas de 2.ª categoria, e estou a referir-me concretamente à tradicional alfarrobeira, produtora de alfarroba.
Deste modo, por uma questão de património frutícola regional, geradora de mais-valias no campo da alimentação humana e animal, desde os tempos mais imemoriais, dever-se-ia pela dignidade que ela nos merece, de a elevar na sua importância arvense, como digna de constar em um local (jardim) de qualquer cidade do interior da província do Algarve. Mas, hélas, não existe nenhuma alfarrobeira em lugar de destaque, com esse propósito decorativo de comemorar a sua preciosa existência, tanto quanto é do nosso conhecimento geral.
A este propósito embelezador vem-nos à ideia de em Trancoso [estado da Baía], no Brasil, o artista chinês Ai Weiwei, com uma equipa de artífices seus, idos da China, duplicaram de forma fiel uma árvore (de 36 metros de copa, com 1200 anos de idade) à escala natural: com tronco, ramos e folhas tudo em ferro, à disposição do público. (vide Internet: <tvcultura.com.br/vídeos/67246_roda-viva-ai-weiwei-1211-2018>: disponível entre os minutos da gravação: 24:28m e 31:39m.
Já não pediríamos tanto como o exemplo do artista Ai Weiwei, mas apenas que se plantasse uma pequena alfarrobeira (numa qualquer praça com atributos topiários - expositivos) que proporcionasse frondosa sombra fresca, e que as as crianças, de forma pedagógica pudessem ser informadas da expressão e valor que a alfarrobeira teve desde sempre para o Algarve. E se tudo isto não é um motivo (esforço) para os mais jovens não se divorciarem do sentido da mãe Natureza, então, não sabemos o que será.
Este é, um projecto, bem o sabemos, que somente gerará visual de valor estético acrescentado dentro de vinte anos. Mas, e por isso mesmo muito interessante, visto não ser um produto imediatista tão ao jeito da nossa época consumista do “pronto a servir”.
O caso em apreço de uma alfarrobeira na sua perene generosidade, daria como exemplo de vida, o seu fruto e a sua sombra a toda a comunidade urbana que a quisesse desfrutar em dias de canícula. Claro que, de uma forma pedagógica e simples na sua eterna dádiva, ela despojar-se-ia como exemplo da sua imitação para todas as circunstâncias do seu donativo desinteressado, que não fosse a sua analogia de vivermos de acordo com a Natureza de forma prática e decorativa, no meio da urbe, cada vez mais desligada do campo.
Quousque tandem (paciência, e espera).
* Mestre em História, pela Faculdade de Letras, da Univ. de Coimbra